Uma
das maiores concentrações da história do País num único local, os
protestos deste domingo na Avenida Paulista - com 1milhão de pessoas
segundo a Polícia Militar ou 210 mil, conforme o instituto Datafolha
- aumentaram fortemente a pressão contra a presidente Dilma Rousseff e
pelo fim da era do PT no poder. Com uma retórica de
hostilidade à esquerda, mas pacífica, espontânea e desvinculada
de partidos ou sindicatos, a marcha foi a mais dura condenação
à corrupção, ao sistema político e aos rumos da economia.
Superou
em público as manifestações de junho de 2013 que, em seu auge, no dia
20, reuniu mais de 1 milhão em todo o país e cerca de 110 mil na
Paulista. Só na campanha das Diretas-Já, em 1984, com 1,5 milhão na
Candelária, no Rio, e 1 milhão no Anhangabaú, em São Paulo, tanta
gente havia saído às ruas apenas para protestar, o que surpreendeu os
políticos e semeou incertezas sobre o futuro do governo da presidente
Dilma Rousseff. Em todo o País, a estimativa é de que o número de
manifestantes tenha girado entre 1,4 a 1,5 milhão de pessoas.
O
protesto também escancarou a luta de classes e transformou a Avenida
Paulista em palco de um perigoso conflito ideológico entre uma classe
média alta, formada em sua maioria pela direita liberal, contra a
esquerda governista escorada em sindicatos e movimentos
sociais que representam trabalhadores urbanos e rurais. Os
organizadores do protesto de domingo não querem apenas lutar contra a
corrupção.
“Nosso próximo passo é derrubar a Dilma”,
disse Marcello Reis, líder do Revoltados Online, resumindo o sentimento
dos grupos cuja pauta - difusa - vai do apoio ao impeachment da
presidente Dilma Rousseff à intervenção militar.
O ódio contra a
esquerda embalou a tarde de protestos: “Não queremos uma nova
Venezuela”, “Nossa bandeira não é vermelha” ou a palavra de ordem “Quem
não pula é comunista”, entoada do alto de um caminhão de som pelo
advogado Rubens Nunes Filho para levantar a massa. Numa cadência de
pulos, os manifestantes respondiam com “Fora Dilma”, “Fora PT” ou
ofensas mais graves a presidente e ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, brindado com um “Lula cachaceiro, devolva meu dinheiro”.
Leia mais: Com discurso de 'Fora Dilma', milhares vão às ruas e despertam reação do governo
“O
que há é um repúdio nacional contra a ideologia comunista”,
disse Rubens, que é advogado e coordenador jurídico do Movimento Brasil
Livre (MBL). Outro integrante do movimento, Ton Martins, defende uma
“intervenção segura” que, no seu entendimento, seria a derrubada do
governo com novas eleições gerais sem a participação de políticos
ficha-suja.
O que também se viu de sobra na Paulista neste domingo
foram desabafos de estudantes da classe A e B, empresários,
profissionais liberais, comerciantes e moradores da mesma região dos
Jardins que, cansados de desmandos, esbravejavam contra toda a
esquerda. Um dos dirigentes nacionais do MST, João Paulo Rodrigues,
antevendo a reação de domingo, previu na sexta-feira que a Paulista
seria o local o ponto de um confronto de posições sobre os caminhos do
governo Dilma: “A luta de classe está aí e estamos torcendo por ela”,
disse ao iG.
Manifestações ganham destaque na imprensa internacional
Renato
Tamoio, dirigente do SOS Forças Armadas, afirma que a intervenção
militar não pode ser confundida com a pregação por um novo regime, mas
não esconde que o objetivo é derrubar o governo. “Impeachment é
ingenuidade”, gritou do alto de um caminhão em que os oradores se
alternavam para pedir a queda de Dilma e a dissolução do Congresso.
Papel dos militares
A
“direitização” do movimento não poderia ser mais explícita: no caminhão
com cartazes e faixas pregando a condenação da política havia uma com
os dizeres “Marcha da Família com Deus pela Liberdade” e “1964 Mais Vivo
do que Nunca”, referência ao mesmo mês de março que terminou com a
deposição do ex-presidente João Goulart, há meio século.
Integrante
do mesmo grupo, o coronel Ricardo Jacob, presidente da Associação dos
Oficiais da Polícia Militar, acha que as manifestações podem forçar
a anulação das eleições de 2014 e a convocação de um novo pleito em que a
votação seria feita com cédulas de papel e não mais em urna eletrônica
que, segundo ele, teria sido usada para justificar uma suposta fraude no
ano passado.
Jacob acha que os militares têm um papel bem
definido na Constituição e, mesmo que aceitem fazer a intervenção num
eventual cenário de desestabilização e quebra da ordem, não se
interessariam mais pelo poder. “Hoje os militares não dão golpe. O que
eles podem fazer, é segurar ou deixar o governo cair”, explicou.
Se defensores
do impeachment - proposta intempestiva diante da inexistência de
vínculo entre a presidente e a roubalheira na Petrobras - precisavam de
pretexto, os protestos deste domingo serviram como luva e, ao que tudo
indica, ajudarão a elevar a temperatura. “Desde outubro estamos batendo
na mesma tecla do Fora PT e Fora Dilma. Agora viram que não é
brincadeira. Não vamos sair das ruas”, afirmou o estudante de
medicina Fábio Sablom, do Movimento Brasil Livre, entidade da direita
liberal que promete levar os protestos a Brasília. Uma nova manifestação
foi marcada neste domingo para o próximo dia 12 de abril em todo o
País.
Foram poucos os políticos com coragem de dar as caras na
Avenida Paulista, mas entre eles, havia até gente da base aliada do
governo no Congresso, como o deputado Major Olímpio (PDT-SP), que não
acredita em intervenção ou golpe, mas deixa claro que votaria por um
impeachment caso apareça prova que vincule a presidente Dilma Rousseff
aos desvios na Petrobras.
“Ninguém mais será capaz de parar o
curso das apurações. Espero que Dilma não esteja envolvida, mas meu
compromisso é com os 180 mil que me elegeram”, afirmou o deputado
policial. Interpelado por um popular que estranhou sua presença na
Paulista, o parlamentar justificou: “O PDT está no governo, mas eu não”,
respondeu.
A presença de Olímpio na Paulista é um péssimo sinal
para o governo, mas talvez sirva como alerta para estimular a presidente
Dilma a colocar peso político na Operação Lava Jato, apoiando com
recursos, determinação e transparência as investigações sobre os desvios
na Petrobras.(fonte IG.COM)